giovedì 28 marzo 2013

A palavra ao estudante... MARIA SERENA FELICI: "Os loucos"




Não sei de psiquiatria, não sei nada que me possa tornar competente numa matéria como esta; posso, contudo, dizer o que penso, o que provém de certa observação da realidade e de conhecimentos anteriores. Uma vez, ainda na escola, assisti a uma conferência sobre a doença mental, em que um grupo de psicólogos e psiquiatras nos ensinaram que não é preciso ter medo dos “loucos”, que a mental é uma doença como muitas outras e que pode acontecer com todos. É verdade; mas eu não consigo não pensar, talvez clinicamente errando, certamente aliás, que os que chamamos loucos são pessoas que não conseguiram aceitar o mundo por como ele é. E que, por certo moto de rebelião que eu, romanticamente, admiro, criaram-se, mesmo em um nível ainda completamente incosciente, um mundo-outro onde talvez não haja tanta frieza e crueldade como neste em que passamos a vida. Já que citei o Romantismo, aliás, todos sabem que a Loucura é um topos da cultura romântica: na literatura como na arte, ela é o fim a que são destinados os infeliz (estava a escrever os vencidos da vida, mas optei por outra solução para não criar ambiguidades).

Mas não apenas no Romantismo: a da loucura é um topos que percorre transversalmente toda a história da cultura e particularmente da literatura, mantendo o mesmo sentido de refugium pecatorum: veja-se Luigi Pirandello, grande escritor italiano do século XX cuja mulher tinha uma forma de doença mental; Pirandello fez da loucura o alvo da sua produção literária, chegando a derrubar o limite “médico” entre saúde e doença mental. Como podemos, diz-nos Pirandello, designar alguém como louco se, na verdade, todos nós temos a nossa própria realidade, que fabricamos pela simples exigência de sobreviver? O facto de algumas pessoas falarem sozinhas em voz alta poderá sem dúvida ser sintoma de doença mental, mas o contrário, isto é portar-se “normalmente” (palavra horrível) em público, poderá dar-nos a certeza de que a nossa realidade é certa, óptima, indiscutível? O que os chamados loucos veem diante de si, ou as vozes que ouvem, não é o mesmo que nós vemos e ouvimos. Mas afirmar que não é “real” é muito mais complicado do que possa parecer. No dia daquela conferência, na escola, eu tive vontade de fazer uma pergunta que afinal não fiz, sabendo que seria uma pergunta “louca”: se eles “não fazem mal a ninguém”, como uma psiquiatra algo egocêtrica (não deixava falar os outros) não parava de repetir, porque não deixá-los em paz na sua realidade? Porque fechá-los em hospitais, quando no mundo há quem seja muito perigoso e está livre de fazer mal aos outros com as suas políticas que matam os pobres? Perigoso pela sociedade é quem tem o poder, não quem o não tem e nunca o terá.

Termino citando outra grande escritora do Novecento itailiano, Elsa Morante, que em Il mondo salvato dai ragazzini imagina que quem devolve a alegria a um mundo triste, cínico, sem esperanças, seja um adolescente com doença mental. No final do poema, esse rapaz que nem fala, que apenas toca uma pequena flauta e é afastado por todos acaba morto pelos nazis; e o mundo, ao perder o som desafinado da flautinha alegre, perde até o menor rastos de encanto que lhe restava. 

MARIA SERENA FELICI

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