Obrigado, Francesca!
A vida da minha casa
Os meus avoengos são de de origem duma aldeia de montanha perto da fronteira entre Itália, Áustria e Eslovénia. Lá habitavam numa casa de pedra de três andares, a jusante das outras casas. No fim do século dezanove, o meu trisavô com os seus irmãos decidiram mudar para planície e comprar uma grande casa, construída em 1640, e terrenos cultivados nas cercanias.
Um dos velhos da família uma vez disse que nesta casa, com o pátio dentro, se sentia protegido, à diferença da casa onde antes moravam, ao lado duma rua, perto da fronteira, exposta a invasões (até o exército do Napoleão passou aí).
A casa era um edifício com forma mais ou menos dum “U”. O lado oeste era propriedade do meu trisavô, o lado norte dos seus irmãos, a leste havia os estábulos, a sul o muro circundante com duas portas de entrada para o pátio e um pequeno pomar protegido do vento por altos muros. No pátio havia um poço e algumas árvores ornamentais. A morada do trisavô tinha três andares:
· No rés do chão havia caves e salas de trabalho;
· No primeiro andar havia salas e quartos;
· O segundo andar era um sótão.
No rés do chão, na primeira cave em frente da porta de entrada havia lenha para queimar (depois seria a garagem). Ao lado havia duas salas de trabalho com instrumentos agrícolas, atrás das salas havia uma garrafeira com vinho e azeite. Mais longe havia duas dispensas e uma outra cave dedicada a curar os queijos e os enchidos.
Em cima dos dois lanços de escada havia o primeiro andar. Em frente da entrada havia uma sala de jantar, à direita da sala de jantar havia a sala do “focolare” (uma lareia, como uma chaminé, mas em vez de ser perto da parede era no meio da sala). À esquerda havia uma sala de estar. Ao lado da sala de estar havia um corredor que levava até aos quartos de dormir e à casa de banho.
Quando éramos crianças, nós irmãos gostávamos de visitar os tios-avós que moravam aí. De manhã brincávamos perto da casa. Eu gostava de explorar o pomar, a minha irmã narrava contos sobre as vacas (a tia-avô dizia que o leite era o melhor!), o meu irmão era demasiado pequeno, só olhava a paisagem.
Ao meio-dia, da sala da lareira difundia-se o cheiro da comida que chamava todos a almoçar na mesa, em cima das cadeiras de madeira. À tarde, todos a fazer uma soneca! Em cima dos sofás ou das camas, altas quanto as janelas, que se podia olhar fora os campos de milho. Para ir à casa de banho, era preciso percorrer todo o corredor que estalava a cada passo. Que medo à noite!
Havia divisões interditas a nós crianças: a cozinha (não te aproximes do frigorífico, do fogão, dos pratos no lava-loiça...!), o escritório do tio-avô no sótão (cuidado com os livros na estante e em cima da secretária!) e sobretudo as caves (nunca vás às caves sem adultos! Os queijos são uma tentação).
Em 1976 houve um grande terremoto que causou 989 mortos e 100.000 desalojados. O epicentro não era longe da casa. A casa foi danificada e, alguns meses mais tarde, demolida.
A família que morava aí, incluindo os parentes distantes, começou a desunir-se. Agora há quem more na Nova Zelândia, Panamá, Inglaterra - como se a casa fosse um elemento importante que ligava a família.
Francesca Della Mea
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