A nossa aluna de nível avançado ANGELA DE CHIRICO brinda-nos com um belíssimo trecho de prosa ficcional sobre o seu "encontro" com António Tabucchi.
Obrigado, Angela!
É meia-noite. Estou no Cemitério dos Prazeres em Lisboa.
Estou aqui porque queria encontrar Antonio Tabucchi. Sei
bem que ele morreu em 2012, estudei a sua obra e a sua vida com muita paixão.
Sei todavia que ele permanece na área entre a
terra e as estrelas, onde se encontram os fantasmas.
Ele falou muito das almas e da confederação das almas e eu
terei certamente a oportunidade de lhe fazer uma pergunta que há muito tempo
tenho guardada.
Não vou enganar-me, como o Narador da
sua obra Requiem, que pensa encontrar o Convidado, Pessoa, ao meio-dia.
Os fantasmas aparecem à meia-noite e, de facto, ele está aqui neste
momento. Usa os óculos e fuma incontáveis cigarros como fazia sempre em vida. Dois homens estão com ele. Eu
conheço só o primeiro que é, óbviamente, Pessoa. O
outro não sei quem seja, mas não estou interessada nele. Estou aqui só por Tabucchi.
Alguém me disse que ele era um grande cozinheiro e eu
queria que ele cozinhasse para mim um dos seus pratos.
Ele nunca gostou da "nouvelle-cousine" e comeria todas
as noites massas italianas ou o portuguesíssimo caldo verde . Convida sempre os
seus amigos fantasmas que se congratulam com ele e comem tudo com grande
felicidade.
Ama os ingredientes da comida mediterrânea, que implicam
uma grande criatividade, não como a cozinha francesa, que tem as ostras e o bechamel e por isso não é difícil fazer um bom
prato.
Eu timidamente faço a pergunta: "Posso comer convosco uma das suas
especialidades?".
Ele olha-me com a sua forma de olhar tão característica e observa-me com
ironia. Diz: "Faça o favor!". Os outros fantasmas põem a mesa
enquanto ele cozinha. Depois comemos um excelente bacalhau espiritual. Sinto-me
muito feliz. De repente ele diz a Pessoa: "Vamos! Tenho um encontro com
outros amigos na Rua da Saudade antes da
madrugada!".
Eu volto-me e não o vejo mais.
Foi tudo só um sonho? Não sei. Mas há diferença entre o sonho e a
realidade? Não tem importância, penso eu... não quando falamos de Tabucchi.
ANGELA DE CHIRICO
Nessun commento:
Posta un commento