lunedì 2 febbraio 2015

1/4: Ferena Carotenuto, “Lemos para sabermos que não estamos sós”


A propósito de uma deixa teatral do texto de Maria Velho da Costa Madame, que na sua estreia no palco estava na boca da atriz brasileira Eva Wilma - no papel de Capitu (a do Dom Casmurro, de Machado de Assis) que contracenava com Eunice Muñoz / Maria Eduarda d’Os Maias - lançámos o repto à nossa turma de nível avançado. Que see screvesse sobre o conceito “Lemos para sabermos que não estamos sós”.


Responderam quatro vozes femininas: as nossas alunas Ferena Carotenuto, Ivana Bartolini, Mariarita Vecchio e Radiana Nigro, com os belíssimos textos que publicamos em seguida e a quem muito agradecemos pelo interesse e pela qualidade dos seus trabalhos.




“Lemos (...)”
A actividade da leitura foi sempre fundamental na minha vida. Começando com o facto que eu era tão impaciente de poder ler, que apreendi a ler sem a ajuda da educadora, aos cinco anos. Ainda devia frequentar a primeira classe, quando no jardim-de-infância começavam a deixar conhecer as letras do alfabeto, uma após a outra, depois de termos traçado os primeiros circulinhos, os futuros “a” e “o”, depois os tracinhos verticais, enfim os arquinhos. Páginas e páginas de elementos gráficos. Nós pequeninos, sem ter ideia nenhuma da razão de tudo isso, inocentes, obedientes, passávamos horas e horas de grande empenho físico e mental, enchendo papéis. Quem sabe se também os génios da literatura, Dante, ou Leopardi, quando eram crianças, traçaram as mesmas linhinhas e circulinhos? 
Então, tantas letras separadas, sons isolados. E um dia de verão, no carro do meu pai, mantendo o jornal no colo, pus os sons e as letras juntos e comecei a ler, tanto era grande o meu desejo de saber o que podiam significar aqueles símbolos misteriosos que cobriam os muros da cidade, estavam em cima das lojas, nas páginas dos jornais. Eu percebia que aqueles sinais eram uma mensagem para mim, e era muito curiosa, à descoberta infantil do mundo. A partir daquele verão de 1966, o mundo da leitura abria-se aos meus olhos: podia iniciar a exploração do oceano imenso dos inúmeros livros do passado, presente e futuro. 
Os livros na casa eram tantos, e eu devia só buscar aqueles adequados para a infância: nem sempre era possível!

“(...) para sabermos que não estamos sós”
É óbvio: quem escreve não escreve só para si, mas também para as outras pessoas. Às vezes uma pessoa escreve um diário, que deveria ser destinado para si próprio, mas é claro que um diário quer sempre comunicar algo a alguém, ainda que só àquele que o escreve. 
Quem tem um livro consigo nunca é só. O ponto interessante é que todos estamos por exemplo em companhia do mesmo autor, lendo o mesmo livro. Mas o tipo de companhia é variável, dependendo de cada uma pessoa na sua unicidade. Para mim os sentimentos causados pela leitura de uma poesia de Montale não serão idênticos àqueles da minha vizinha Bárbara, lendo a mesma poesia. Nesse sentido, todos estamos intimamente relacionados de várias maneiras  com os autores: a nossa é, e sempre será, uma relação unívoca, isto é, eu e o autor. Relação que muda no tempo e no espaço em termos de qualidade, dependendo de condições diferentes: as minhas reacções lendo Montale na juventude com certeza divergem com os sentimentos que tenho lendo Montale no outono da vida. 
É bom que, lendo livros, nunca estejamos sós. É positivo ter livros. O livro é sempre um óptimo amigo: nunca te vai deixar sozinho. E o livro é também amante dos solitários.
Faz bem possuir livros e ter inúmeras possibilidades de leitura em qualquer momento: abre-se então o contacto autor-leitor, contacto longínquo embora imediato. 
Porque é fantástico poder falar com os mortos, caminhando pelas ruas da cidade e levando consigo na mochila Dostoievski. Embora Fëdor tinha morrido há mais de cem anos, ele é ainda vivo e fala connosco quando nos comunica os pensamentos de Raskólnikov em Crime e Castigo. E assim será com todos os autores que poderemos ler até o fim. 
Que pena não poder ler todos os livros escritos neste mundo! Não poder ter aquela biblioteca infinita, a Biblioteca de Babel, para falar como Borges. 
Enfim, os livros vão ser eternos até que haja leitores. Nesse sentido, graças à literatura, ninguém estará só, até que haja um único livro na terra.    


FERENA CAROTENUTO

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