venerdì 21 maggio 2010

STEFANO VALENTE: "Destino inelutável"

O nosso aluno Stefano Valente, que por várias vezes tem contribuído com a excelência dos seus trabalhos para este trabalho comum que é o blog "Via dei Portoghesi", oferece-nos mais uma página de rara inteligência e sensibilidade num Português perfeito.
Bem-hajas, Stefano!
Iluminura do Cerco de Lisboa de 1384, na Crónica de Jean Froissart


Destino inelutável

São muitos os erros de perspectiva com que nós, europeus, olhamos a “periferia” do continente. Erros, ou melhor, preconceitos históricos, que nos levam a considerar a Península Ibérica segundo as mesmas categorias de pensamento com que estamos acostumados a falar, por exemplo, da génese e do desenvolvimento da Alemanha, da França, da Inglaterra ou da Itália. E isto sobretudo no que diz respeito à Idade Média, período amiúde julgado só a um nível superficial, constrangido dentro duma descrição de lutas feudais, regicídios e guerras santas (quase) de repente interrompido por um outro erro – desta vez náutico –: o dum certo Cristóvão Colombo.

Mas às vezes – e afortunadamente – acontece de encontrar no nosso caminho historiadores “diferentes”: é o caso da Professora Filipa Roldão. Na sua lição magistral de 13 de Maio a investigadora evidenciou os processos básicos do nascimento do reino de Portugal, desde o núcleo primitivo do Condado Portucalense – sufocado entre os diversos “espaços” cristãos (os reinos de Leão, Castela etc.) e muçulmanos (os chamados assim «Reinos de taifas») – até a formação do mesmo estado lusitano através do povoamento e da urbanização fortemente desejados pelo poder régio.

Porém, desde o século XII até o XV – desde Dom Afonso Henriques «o Fundador» até Dom João II «o Príncipe Perfeito» –, o que verdadeiramente acaba para nos impressionar é o inexorável movimento-fluxo Norte-Sul, interior-exterior, da futura nação portuguesa. Filipa Roldão marcou bem como Portugal (e também a sua língua, a sua economia e as suas estruturas sociais) tenha começado a sua “descida” do originário condado galaico de Portucale até à foz do Tejo e às costas do Oceano – das quais logo irão partir as caravelas dos descobrimentos. Uma “descida” iniciada aos passos, povoado a povoado, castelo após castelo – conquistando ou reconquistando, não è importante –, que nunca irá parar a não ser nas derrotas (por exemplo a de Alcácer-Quibir, 1578) que levarão à perda do imenso império marítimo.
(Um império realmente nunca perdido – pois que continua até hoje graças ao quinto idioma mundial. Ou, pelo contrário, eternamente perdido – pois que os portugueses nunca chamaram às colónias senão de «Ultramar».)

Povo gentil, fechado em si mesmo, com alma do Norte, o povo português. E, contudo, inelutavelmente destinado para o Sul e para fora. Então a História da Idade Média lusitana não seria o embrião da sua vocação futura? – e o gérmen de todas as suas saudades? Ou isto é apenas o conto duma visão um pouco lendária e um pouco triste (mas que não pode ser de outro modo) com que um heterónimo – quem sabe qual – doente de retórica e de sebastianismo sonhou à beira-Tejo?…
Castelo após castelo.
Além da linha de Lisboa.
Até o Oceano.
Não pode ser de outro modo.

Embora um certo Saramago nos ensine que os cruzados poderiam também não ajudar os portugueses (1)…

(1) História do Cerco de Lisboa, 1989
STEFANO VALENTE

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