O primeiro carré da
Hermés desenhado por uma portuguesa
Katya Delimbeuf, 13.01.2018
in http://expresso.sapo.pt/sociedade/2018-01-13-O-primeiro-carre-da-Hermes-desenhado-por-uma-portuguesa
A peça exclusiva executada pela artista Bela Silva estará
à venda em terras lusas no final de janeiro
Ser dono de um
carré da Hermès é mais ou menos equivalente a ter uma cadeira Panton na sala.
São ambos clássicos, um do mundo da moda, outro do design. Tornaram-se
clássicos porque, ao longo dos anos, resistiram às novidades, pela sua
qualidade intemporal.
À semelhança dos
relógios Patek Philippe, que passam de geração em geração, uma avó pode dar à
neta um carré da casa Hermès sem correr o risco de parecer antiquada. Como uma
boa mala que resiste aos ciclos da moda e passa de mãe para filha, um carré –
lenço de seda de 90 por 90 cm, que pode ser usado ao pescoço, na cabeça, no
pulso ou à cintura – nunca passa de moda.
Agora, uma artista
portuguesa vai entrar na história destes adornos têxteis: Bela Silva desenhou o
último carré da casa francesa fundada em 1837, que nomeou "La Maison des
Oiseaux Parleurs". Já anda nas montras de Paris, mas a Portugal chegará no
fim do mês (PVP €360). Em vários tons de azul e beje, são os pássaros e as
flores que chamam de imediato a atenção. Foi no trabalho de colagens,
essencialmente, que Bela Silva se inspirou, como explicou ao Expresso por
telefone, desde a Bélgica, onde vive há seis anos. Focou-se no imaginário dos
"papéis antigos, dos animais, dos cabinets de curiosités" do
Renascimento, explica.
No início do
processo criativo esteve o livro persa "Conferência dos Pássaros", do
poeta Farid ud-Din Atta, onde a artista foi buscar a ideia de diálogo. Foi
assim que surgiu o nome do carré, "La Maison des Oiseaux Parleurs"
("A Casa dos Pássaros Falantes"). Ao todo, foi um período de dois
anos de trabalho, ao abrigo da confidencialidade, dos primeiros encontros à
manufatura do carré, a cargo de "uma equipa fantástica, de gente que
trabalha com as mãos", destaca Bela Silva. Gravura, coloração e impressão
são assegurados pelos experientes artesãos que transformam desenhos em carrés
de seda.
A artista confessa
que fazer um carré para a Hermès "era um sonho de há muito". A mãe
era costureira, e Bela sempre conviveu com padrões, o que lhe deu proximidade
ao universo do têxtil. E claro, trabalhar com uma casa com a tradição e
qualidade da Hermès também pesou. "Sou a primeira artista portuguesa a
trabalhar para a Hermès", diz com orgulho.
Tudo começou quando
uma pessoa da casa francesa viu os seus desenhos numa exposição em Paris, e
decidiu visitá-la no seu ateliê de Bruxelas. "Disseram-me: os seus
desenhos não são muito o estilo Hermès, mas gostámos muito do seu traço."
Depois, em Paris, "quiseram dar-me um tema, mas eu expliquei que bloqueava
quando isso acontecia...", revela. "E foi assim. Fiz três desenhos,
de rajada, e funcionou."
O carré desenhado
pela portuguesa Bela Silva, "La Maison des Oiseaux Parleurs" já se
pode ver nas montras de Paris. A Lisboa, chega no fim de janeiro
O carré desenhado pela portuguesa Bela Silva, "La
Maison des Oiseaux Parleurs" já se pode ver nas montras de Paris. A
Lisboa, chega no fim de janeiro
Foi a primeira vez
que Bela trabalhou num desenho tão pequeno, de 90 por 90 cm. A artista, que
viveu muitos anos em Nova Iorque e noutras cidades do mundo, afirma: "Hoje
em dia, o meu país é o meu ateliê".
Em Portugal,
notabilizou-se pela obra de ceramista, tendo trabalhado estreitamente com a
Fábrica de louça Bordallo Pinheiro. Licenciada em Escultura, e Mestre em Arte
pelo Art Institute de Chicago (EUA), já expôs na Ann Nathan Gallery e Rhona
Hoffman Galler, de Chicago; e também em Portugal, Brasil, Espanha, França,
China e Japão, entre outros países.
A história do quadrado de seda
Foi há quase um
século que nasceu o primeiro carré da Hermès. Hoje, vende-se um a cada meia
hora. Em 1937, o então diretor da Casa, Robert Dumas, criou o primeiro carré, a
que chamou "Jeu des Omnibus et Dames Blanches", inspirado num popular
jogo da época. As dimensões ficaram fixadas em 90 por 90 cm, e o material é
sempre a seda.
Os motivos
decorativos começaram por ser do mundo equestre, da caça e das carruagens,
associadas à génese da Hermès. Depois, foram-se diversificando: dos animais ao
desporto automóvel, do desporto aos símbolos gráficos. O acessório que começou
por ser essencialmente feminino, é hoje também uma opção para homens. Duas
vezes por ano, a coleção é renovada.
Cada carré é
chamado de papillon (borboleta) pela casa Hermès, porque corresponde à produção
de 300 ovos, a capacidade máxima de produção do bicho da seda durante a vida
(na verdade, corresponde a 450 km de seda). Este processo moroso e manual,
feito nos ateliês da casa em Lyon, é típico do segmento do luxo. Desde 1937,
são mais de 1500 os motivos serigrafados dos Carrés Hermès. Agora, uma
assinatura de Portugal passa a constar dessa história.
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