martedì 22 marzo 2016

Matteo Canale: "Os lagartos ao sol"

O nosso aluno Matteo Canale responde ao repto de comentar criativamente  a composição poética de   Alexandre O'Neill,"Os lagartos ao sol":




OS LAGARTOS AO SOL


Expõe ao sol a perna escalavrada,
no jardim do Príncipe Real,
uma velha inglesa. Não há nada
tão bonito (pra mim), so natural.

E conversamos: “Helioterapia
medicina barata em Portugal”.
Acionista do sol, ajudo à missa:
“But, não muito, que senão faz mal”.

Gozosos, eu e a velha, ali ficamos
à mercê de meninos e marçanos.
Ela, a inglesa, de perninha à vela;
e eu, o português, à perna dela.

Talvez que, se Briol nos conservara,
alguém um dia nos ajardinara.



Uma pequena nota sobre Os Lagortos ao Sol – Alexandre O’Neill 
  MATTEO CANALE

os amantes são sempre extravagantes
e ao frio também faz calor


Embora o Tiago Bettencourt cante da sua indiferente Morena que ela “não chora / com um fado negro de Oulman / nem com um poema de O’Neill / na primeira luz da manhã”,  é fácil imaginarmos que ao fim destes delicados versos – apesar do Briol ventar e gelar os amantes - a velhinha inglesa vai cair enamorada pelo seu lagarto português; e pelo mesmo poeta, que lhe está a oferecer a última oportunidade de se sentir desejada…   

De facto há um divertido e emocionante jogo de reflexos neste poema - erudito na forma e compreensível no seu tema -  que nos ajuda a comprender que as coisas podem ser  lidas de muitas diferentes maneiras. Consideramos, por exemplo, os personagens: ninguém sabe o pode definir a idade do sedutor, se é um velhinho em gabardina, que está a queimar os últimos seus cartuchos, ou um jovem aventureiro, tentator serial à moda do Dom Juan mozartiano, que “delle vecchie fa conquista/ pel piacer di porle in lista”. 

Só temos a certeza que este poema é um hino en honra do amor e das suas seduções: deduzimo-lo da elegante forma poetica, que o poeta O’Neill escolheu: o soneto inglês à moda da poesia Tudor, que naquelas alturas era construído em três quartinas, de rima alternada, e um dístico ao fim, onde o nosso poeta faz explodir a sua ironia e nos deixa a ideia de um final aberto cheio de incerteza. Então, estamos agora todos aqui a perguntar: o que (não) aconteceu? 

Na verdade a sintaxe rápida, a forma de diálogo, o uso de palavras de diferentes línguas juntas e misturadas, indica-nos de maneira muito clara e sem indecisão o que aconteceu: todos os versos simulam um jogo de olhares e de leques. E ao fim, o climax destas alliterações “à mercê de meninos e marçanos” insinua-nos e sugere que não haveria alguma escapatória para a velhinha (ou para o português!). 

Aquela harmoniosa conversa, nunca apagada, terminará numa maniera perfeita: sem nunca diminuir o brilho do encantamento da sedução. De facto, não há forma melhor de amar senão conseguir o jogo da seducão, como nas estatuetas de porcelana, que imitam um leve e gozoso momento que nunca vai parar. 

MATTEO CANALE


1 commento:

epizefiria ha detto...

Interpretação profundamente sentida e animada!
O comentário do Matteo tornou-se numa pintura: Ut pictura poësis!!! I.