Muito obrigado FERENA CAROTENUTO, GIOVANNA SCHEPISI e RADIANA NIGRO!
Uma vaga oceânica, calma e lenta, no coração
António em Latina, Itália.
A procissão dos frades franciscanos no dia de Santo António, a 13 de Junho
1962. Procissão vista da varanda por uma menina curiosa dum ano, e o namoro com
uma estátua dele, jovem e doce, delgado e terno com Jesus pequenino nos braços.
Nem ela sabia pronunciar bem as palavras então, e após a procissão continuava a
repetir como uma canção "Tatatonno mio (Santo António meu)" nos dias
seguintes. A vida continua tranquila, sem outros sinais daquele âmbito, mas a vaga está já
formada no coração.
Santiago. É o ano 1999 e um grupo de guias vai de
férias no inverno para Galiza. Peregrinação para Santiago de Compostela.
A menina, agora adulta, encontra gente que não baila em cima das mesas como ela
imaginava em Itália.
Gente atlântica, que é calada e um pouco melancólica. E uma
língua que não é espanhol e que eles defendem orgulhosamente. A vaga começa a elevar-se.
A gente. Mais anos passam, e um dia acontece que,
faltando guias de língua portuguesa em Agosto, um grupo de portugueses chega a
Roma para uma visita, e ela é a guia italiana que, em espanhol, deve
conduzi-los à Basílica de São Pedro. Ela estava convencida que os portugueses
eram espanhóis do norte, nada mais. Na praça há uma fila de duas horas. A guia
receia a reacção deles, fartos de esperar assim tanto tempo. Fica à espera de
fogo e chamas e... nada acontece. Calmos, pacientes, os portugueses põem-se na
fila e esperam e escutam as palavras estrangeiras dela. Abre-se uma janela na
sua mente: "Então eles não são espanhóis do norte". A vaga é ainda
mais alta.
A língua. Chega o momento de encontrar finalmente este povo e a sua língua, por meio
do instituto Português de Santo António, graças à intercessão duma querida
amiga. Ela gosta imenso do som, gosta da musicalidade e do claro arcaísmo dos
verbos e das palavras. Parece latim! Grande entusiasmo e vontade de estudar e aprofundar
a história e a cultura portuguesas. A vaga continua a subir.
O fado. Algumas semanas após, choque sentimental
com o fado, durante o concerto da Mafalda Arnaut. Revelação, emoções muito
intensas, saudade, e tristeza, mas também que romântico! A vaga chega ao
ponto máximo de elevação.
Bósnia. Outra peregrinação, desta vez pela Bósnia.
Ao lado da menina, uma senhora portuguesa com filho casado com italiana (as
consequências mais visíveis do Erasmus).
A senhora portuguesa quer ter um neto. Ela, pela sua parte, quer compreender
por onde está a caminhar na vida. Vão pedir uma graça a Maria, no lugar das
aparições quotidianas aos videntes desde Junho 1981. No dia 8 de Dezembro, dia
da Imaculada Conceição, padroeira de Portugal, deixando o monte da aparição, a
menina vê o sol girar no céu. Como em Fátima. A primeira que acredita é a senhora
portuguesa. O pároco duvida, diz que é um reflexo da luz. Todos param e olham
para o céu. Fixam o sol, que brilha luminoso, alguns minutos. O sol gira (não é
possível olhar para o sol sem protecção adequada nem dois segundos, e eles
ficam a observar sem problema nenhum vários minutos). A fé da senhora
portuguesa! A vaga inclina-se.
Lisboa. A luz de cristal do céu enevoado,
reflexão dela na água. A água do Tejo, que para uma romana, parece um mar. Uma
cidade triunfal de cores claras, de pedras brancas, de igrejas nobres. O
delírio religioso gótico flamejante do Jerónimos. O túmulo do pai da língua. O
túmulo dum poeta cujo nome está escrito nas águas volúveis das chuvas
lisboetas. A gente muito cortês, lembrança de antiga nobreza. Comida delgada,
sabores elegantes, café excelente, vinho para sonhar o infinito. A vaga rebenta.
E irrompe
a paixão.
FERENA CAROTENUTO
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